trazia no olhar a dor de quem ainda queria amar no sossego das almas...
suspirava tirando trovas do coração soletrando lágrimas em forma de amargura ...
olhei para ela e não consegui ficar quieta, o coração dela saltava dentro do peito... ia casar para Junho, tudo estava marcado e apenas num momento tudo estava perdido ... apenas porque outro amor suplantou o seu ... mas havia uma criança, que não era dela ... era demais... ela queria desistir...
tomei-a pela mão e tentei que olhasse as outras mulheres, as mães vergadas pela fome,pela dor de não terem lar , de não terem pão e a dor de não terem ninguém que as amasse tanto que não as deixasse chegar a uma situação de miséria.
envergonhada olhou para o chão e disse :- tem razão eu estou a ser egoísta ... não, disse-lhe eu... está apenas embalando a sua dor, acorde e vamos em frente .
saiu meio envergonhada e eu continuei recebendo pedidos de ajuda para muitos lares sem pão e com uma dor no peito inimaginável ... a dor de ver os filhos chorar.
meus olhos caíram num texto apressado solicitando apoio a mais uma empresa...
a Rádio Renascença liga para mim e como acordada de um sonho, suspensa ainda de todas as dores e borbulhando nas opiniões de quem não sabe o que fazer do referendo que está à porta, apelei para que não apenas se defendesse a vida no ventre mas que todos viessem em defesa de vida aos dois, quinze, vinte , quarenta , oitenta anos...porque afinal a vida começa no ventre mas termina no olhar, quando os nossos olhos insuspeitos lançam o último olhar à vida.
tudo isto por amor... apenas porque em qualquer situação as lágrimas são salgadas imterpretando a dor que já não cabe no peito.
todo estava preparado para ali realizarmos o evento que tínhamos programado, mas nem tudo estaria tão bem ao nosso alcance, se de repente os meus olhos não se voltassem para um banco de jardim...
o meu olhar se demorou ,em dois homens que dividiam amigavelmente um parco repasto para continuarem a sua jornada de peregrinos da cidade...
apressei-me e serena mas confiadamente olhei para os olhos de ambos... os dois de repente se apressaram a limpar as mãos nas calças sujas, para estarem mais à altura de quem a eles se dirigia ...
saudei-os, pois que já os conhecia de serem frequentadores habituais do nosso refeitório...
eu não sabia que estava a fazer história e perguntei se eles seriam capazes de nos ajudar... lestos responderam que sim , terminaram rapidamente o seu almoço e juntaram-se satisfeitos ao grupo de voluntários que ali estavam para levantar uma vintena de tendas para a realização do certame...
assim, confiando uns nos outros o nosso problema estava solucionado... ficaram durante aqueles três dias como guardas do espaço a céu aberto no Jardim da Praça da República ...
a partir daí ficaram connosco para outros serviços e um deles jamais se apartou de mim...
ali , naquele local ,adoptei um filho... dos dois o que tinha nome de flor .
como em todas as histórias, os anos foram passando e tudo dá os seus frutos... deixou de ser sem abrigo, refinou os seus hábitos, namorou, casou e hoje é pai de uma linda menina... afinal a flor daquele jardim, naquele dia de sol estava à espera para nascer...
abençoado banco de jardim que guardou este ser humano, para que nós o pudéssemos encontrar.
é só olhar os jardins, tantos que por lá andam. à espera de um convite...
já colhi outros , sem resultado positivo, talvez este como estava no jardim tivesse mais luz... quem sabe... o importante é que hoje é um homem , honesto, intempestivo , mas muito trabalhador, confiante nas suas aptidões e esperto com vontade de singrar na vida...
todas as flores dão fruto é necessário saber tratá-las...
agradeço ao Senhor por aquele dia e sempre que seguro a sua menina nos braços me lembro desse banco de jardim e louvo por não me ter distraído com outros afazeres e seguido a minha intuição...
As situações que embrulham a pobreza são cada vez mais gritantes...
Quem é pobre cada vez tem mais dificuldades em viver e cada vez mais angustiante se torna a nossa missão...
Ontem no conjunto das famílias que vieram abastecer-se como habitualmente nos Espaços do Coração, a tristeza era muito grande e estupefactos ficamos quando muitas mulheres se sentiam injustiçadas, lamentando a vida e chorando, porque ainda não tinham recebido o rendimento de apoio social de Dezembro e o subsídio de desemprego e por isso mesmo não puderam pagar o aluguer e outras despesas bem importantes para quem precisa de viver e que tem crianças à sua guarda...
Mas o mais caricato é a singular e disparatada situação dos que são inquilinos da Câmara Municipal do Porto, que sendo pobres e vivendo dum mísero apoio ainda vêem a sua renda agravada com juros por não pagarem a tempo a mensalidade acordada...
A miséria já custa... mas a estupidez e a desfaçatez custa muito a aceitar...
Quem seria o ignorante que se deu ao desplante de agravar as rendas económicas deste jeito ?...não sabia por acaso que estas pessoas não tem ajudas de custo para o que quer que seja, que vivem das sobras duma sociedade que prefere ser indiferente a ter que ajudar a miséria que diariamente se desenrola aos olhos de todos...
Onde está o ministro que conseguir viver com 167 euros por mês ?... até mesmo com 500 euros e ter de pagar renda , água , luz, gás , infantários , etc...?
A indiferença é um tapa olhos que muitos querem usar e brincam à cabra cega todos contentes...
Eu continuo a dizer se a intenção é exterminar o povo que é pobre, reduzindo esta classe que a tantos incomoda, podiam dizê-lo de uma vez por todas, mas não é admissível que se prolongue por mais tempo este ataque surdo a quem já vive tão mal... porque este holocausto vivo não é virtual, não ... é doloroso de enfrentar e tem que ser denunciado...
Quem manda prender os que deixam as crianças a viver nesta aflicção ? ... sem garantias de futuro...sem condições de progredir mais um pouco no seu percursso escolar?... mulheres grávidas que já não têm mais nada para vender... porque já pouco ou nada tinham...
Se os movimentos que vejo por aí , fossem mais coerentes com a prática da verdade seriam muito úteis fazendo mais barulho para que se aplicassem leis mais justas em relação à pobreza...
Somos um país de mendigos ... onde os topos de gama estão todos vendidos e as famílias portuguesas continuam à espera dum mísero apoio para conseguirem morrer são daqui por algum tempo...
Caricaturalmente somos um país sem água a beber whisky de vinte anos ...
A desilusão com todos os políticos que se alardeiam democratas é total... a democracia sente-se envergonhada de ter tão indignos representantes, que nos arrancaram à ditadura para nos verem agora a agonizar lentamente...
Que dor ... apenas mudamos de cela... e ninguém faz nada por nós...
há quem lhes chame filhos de um Deus menor... eu prefiro chamar-lhes os filhos da outra margem...
andam muito e por onde calha, vivem das sobras que a humanidade lança fora com desdém, têm como tecto a lua, o luar quando acontece empresta nuances de paz... sobra-lhes em medo o que lhes falta em carinho, ninguém os quer ver por perto, todos os conhecem, mas não são parentes de ninguém , são portugueses sem direito ao serviço nacional de saúde...
trazem apenas consigo tudo quanto possuem neste mundo ( nada mais)... sorriem com dificuldade e quase todos apresentam problemas emocionais muito graves, psicopatologias medalhando o circuito mental que lhes permite viver ao relento com a facilidade com que os outros habitam as suas casas ... mas , quando chega a noite, a dor aperta e o seu olhar procura dolorosamente o espaço mais seguro para adormecer.
amam sim ,com uma necessidade visceral ,na vã tentativa de voltarem ao colo da mãe que na infância lhes prometia tudo ,apenas com o olhar...
mas fazem amor ao vento... assustando as paisagens citadinas sem gemer e com medo... e os filhos do luar acontecem... alguns andam por aí, pernoitando de vez em quando em pensões duvidosas que rapidamente não se podem pagar, para que ninguém lhes tire os pedaços do seu coração...
todos os ignoram, já que as leis não chegam até para os ( normais)...
as suas emoções são pagas com escárnio e maldizer, mas quando falam inventam vidas , adoptam roupagens que gostariam de ostentar, em terras que nunca conheceram, fugindo assim da curiosidade a que ninguém tem direito, já que no seu entender ninguém os ama...
livres como pássaros emigrantes, vivem da esperança que os deuses distribuíram aos homens por eles amados, mas gozam de uma liberdade que mal se entendem...
não querem morrer e insistem em permanecer de pé, mostrando aos outros como eles amam mal... são os pedestais da desumanização mostrando vivamente que tudo está por fazer...
têm direito a comer na rua, no trato quase cristão de gente de bem... muito poucos ousariam franquear-lhes a porta...
são eles as pessoas sem abrigo na alma da gente... os filhos da lua, aqueles que se cobrem com telhas de lã... representando a dantesca desordem dum país europeu...
mas o nosso mundo indigente está a mudar... os factores se invertem e hoje é possível perceber com dolorosa agonia que os castelos do passado são as ruínas do presente...
nesta divina comédia, os novos pobres estão a surgir e se não amparar-mos o processo com olhos de ver, vamos percebê-los na cidade mostrando dolorosamente o lado infecto das resoluções por tomar, das leis sem serventia, da serpente burocrata e do domínio dos que se servem da sua indigência...
aprofundar a dor das pessoas sem abrigo é abrir fendas na nossa alma... porque eles ficam entre a Terra e o Céu impedindo a nossa passagem...
coragem para mudar ... sem subornos celestiais... com interesses de paz...
a experiência na Terra mostra que ninguém tentou de verdade e que aqueles que o tentaram foram exterminados...
o amor assusta os ratos da política e a polis adere frequentemente à imobilidade traduzindo apenas páginas de interesse pessoal ...
mas...
diáriamente se pronuncia a máxima que Ele ensinou ... AMA AO PRÓXIMO COMO A TI MESMO...
este poema é dedicado a todos os voluntários e pessoas de bem que estão em serviço constante para que oo mais desprotegidos fiquem bem...
ontem ficamos estarrecidos... mais um acidente e ficamos sem o último veículo que tinhamos... um condutor cansado não respeitou o sinal vermelho e atirou-se para cima dos voluntários que seguiam correctamente na sua facha.
Graças a Deus ninguém se feriu...
um anjo esteve lá olhando pelos voluntários do Coração da Cidade...
ainda há quem duvide e continue a fazer mal aos outros ... a misericórdia dinina sempre está presente... obrigado Senhor.
flores para o meu anjo... e para todos os anjos que velam pelo Coração da Cidade.
aqui recebemos tudo quanto é necessário e diáriamente... assim será mais fácil também para nós, para que possam aderir à cadeia de solidariedade alimentar que está no ar a partir da 1 hora da manhã ...
Temos discutido várias vezes sobre a caridade, sobre a justiça social, sobre a diferença entre ricos e pobres... mas ainda ninguém se debruçou sobre a possibilidade de nem todos os que lidam com a pobreza estarem efectivamente, motivados ou credenciados para lidarem com ela.
A pobreza é e será sempre como um virus que muda a cada passo e por isso mesmo é preciso senti-la e amá-la para lhe perceber as mutações... é preciso estar perto dela.
Em Portugal ,estamos sem qualificação para lidarmos com os problemas sociais... pior ainda ,somos muitos a não fazer coisa nenhuma e sempre com custos altíssimos.
Não menosprezando o trabalho, de quem com a pobreza se desgasta, não posso contudo dizer que está tudo bem porque estaria a faltar à verdade e a pobreza não merece tudo isto que está a acontecer.
Somos um país estranhamente reunido 60% do tempo em que deveriamos agir... muitos quadros técnicos, estão reunidos constantemente, sem que dessas reuniões possam sair ditectrizes concretas e com valor palpavél para tratar de um problema tão grave como o da pobreza.
O fosso entre pobres e ricos é enorme, por isso mesmo se vai alargando, porque não interessa que seja diferente, porque se a pobreza desaparecesse, os novos pobres seriam aqueles que neste momento são pagos para olharem por ela.
É necessário educar... a isso se chama construir... não podemos viver mais, numa ditadura dissimulada, por um manancial de pseudo sábios, que nada de novo trazem a este problema.
O povo está inquieto, mas também por falta de imaginação e de vontade de progredir.
Existe falta de emprego.... ?...! mas não existe falta de trabalho... o importante também é que cada um se mobilize no sentido de construir sem que disso mesmo tire lucro pessoal, a não ser o lucro imediato, que é a final, o crescimento interior de quem já se dimensiona solidariamente para os outros.
Somos um povo tristemente mal educado e por isso mesmo sem imaginação... e não gostamos de aprovar ideias que não sejam oriundas de pessoas que consideramos importantes, que provenham de alguém com as mesmas ideias religiosas ou políticas, que que eventualmente tenha um curso superior.
Sem vaidade... não tenho nenhum curso suprerior, mas dou cartas em matéria de assuntos sociais e com a pobreza sempre consigo imaginar mais um pouco todos os dias, para dininuir a amargura de quem ainda acredita , tal como eu, que é possivel ser feliz.
A vida pode ser para nós uma enorme universidade onde sempre aprendemos, desde que estejamos prontos para ouvir e aplicar...
O Coração da Cidade vai alargar o seu espaço de trabalho mais uma vez e vai conseguir... o novo programa iniciado há seis meses está a ser um êxito e vai certamente alargar-se a mais cidades do país... mas se os representantes do nosso governo o colocassem em funcionamento em outras localidades onde os desocupados se ocupam com assuntos pouco dignificantes , Portugal não seria lider apenas das questões menos saudáveis do quotidiano.
Neste momento é necessário despenalizar tudo, porque não se educou o povo português para nada e penalizar aqueles que foram formados e indigitados para educar e nunca o fizeram.
É preciso criar estágios ministeriais em bairros de lata, em ilhas do Porto e não só, em avenidas poluidas e em cidades onde se transita a 30 km... é preciso estagiar em mesas sem pão e adormecer no chão das cidades onde o lixo acampa, por incúria camarária, é necessário acordar sem um tostão no bolso... quem sabe assim a imaginação não produzia ministros mais conscientes e activos promulgando e homologando com objectividade e em tempo útil,.
Portugal precisa de crescer ... todos somos Portugal
Quando a natureza fala, o coração desperta ... e seja qual for a idade, as histórias de encantar continuam a despertar em nós motivos para continuarmos vivos e protagonistas de outras muitas histórias que Deus continua a escrever , apenas para que pensemos um pouco.
A história que vou contar, apesar dos meus 55 anos, fez-me recuar no tempo...sentei-me como se fora criança e fiquei a admirar o quadro que lentamente se movia na minha frente.
Estavamos na véspera de Natal, a tenda natalícia, montada para os mais desprotegidos, resplandecia num clima de paz, luz e som... as mesas milimétricamente dispostas e decoradas para um jantar real, sem que nada estivesse fora do síto, espelhavam o amor com que foram concebidas e toda a decoração, era caracteristicamente a imagem do Coração da Cidade.O cheiro a canela espalhava-se por toda a parte e o bolo rei começava a chegar , ilustrando de forma redonda e colorida a solidariedade da gente do norte.
De repente olhando o presépio, gigante na sua postura fisica , notei que para além da cor púrpura a dourada de que se revestia, mexendo a medo e bem perto do menino de carne rosadinha, um montinho de pelinho muito preto começava a despertar, com o olhar mais meigo do mundo e serenamente acomodado, indiferente a qualquer dos voluntários, voltou a entrar no mundo dos sonhos onde só os gatinhos podem entrar.
É normal ver a vaquinha e o burrinho no presépio, mas um gatinho que se tenha acomodar nas palhinhas do presépio, aconchegando o menino... aí é mais estranho.Só no Coração da Cidade é que é possivel dividir todas as coisas, até o menino do presépio divide a caminha com o gatinho.
Lembrei-me do chão sem palhinhas dos que não têm cama para dormir e pedi a Jesus que colocasse um presépio em cada rua, onde os irmãos do luar pudessem adormecer.
Como seria bom que os humanos dividissem o seu presépio, como seria bom que todas as crianças cedinho aprendessem a dividir o seu conforto com aqueles que nada têm .
Se tudo fosse à imagem da humildade do gatinho e do amor do Menino Deus, o mundo seria muito melhor e assim não haveria necessidade de existir O Coração da Cidade... viveríamos então num presépio vivo do tamanho do mundo ... o grande coração universal.
Ai se me permitissem construir um presépio à minha maneira...